Aproveitando a data, vou publicar o meu relato do parto da Ju, originalmente postado no blog da Renata.
Minha gravidez foi totalmente planejada. Eu e o Fabio decidimos quando eu iria parar de tomar pílula e ficamos esperando. Como demorou um pouco e eu tenho problema com cistos nos ovários (um deles aproveitou a falta de pílula e resolveu crescer horrores), tomei um remédio para estimular a ovulação e pronto: engravidei.
A gestação inteira foi tranquilíssima. Nem parecia que eu estava grávida. Eu sempre me recusei a virar aquelas grávidas que acham que não podem fazer nada. Menos de uma semana antes da Julia nascer eu estava na balada, curtindo a despedida da barriga do jeito que gosto.
Na minha família a cesárea sempre foi considerada uma opção para emergências ou necessidade médica real. O parto normal é o jeito certo de o nascimento acontecer, é melhor para a mãe e para o bebê, por isso nunca foi uma dúvida na minha cabeça.
Então, querendo me preparar da melhor forma possível, assim que soube que estava grávida, entrei em contato com uma fisioterapeuta que haviam me indicado por trabalhar especificamente com gestantes. Foi assim que conheci a Renata. E ela me apresentou o mundo do parto humanizado e do trabalho da doula. Um mundo que eu desconhecia. Sempre ouvi falar em parto natural, com aqueles relatos lindos de parto na água ou ‘no meio do mato’, mas sempre achei que era uma coisa meio hippie e distante. Conforme fui conhecendo esse mundo, fui percebendo o quanto queria fazer parte dele.
Acontece que a Renata também me apresentou o mundo da obstetrícia moderna. Eu não fazia idéia do quanto o nascimento de um bebê havia se tornado um evento frio, mecânico, sem a participação efetiva da mãe e da família. Acabei me tocando de que meu médico não faria mais parte do parto da minha filha. Não que ele não seja um bom médico. Na verdade, ele sempre foi ótimo comigo e eu e o Fabio gostamos muito dele. Acontece que as nossas linhas de pensamento não batiam. Por isso, procurei um novo profissional, voltado para a linha humanista, para me acompanhar. Passei a fazer o pré-natal com a Dra. Mariana, que trabalha exatamente da forma que eu queria.
Passei todo o período da gestação me exercitando, lendo muito e me preparando física e psicologicamente para o parto. Aliás, a gestação toda foi isso: planejamento, planejamento, planejamento. Tenho certeza que muita gente vai ler isso e achar um absurdo. Eu e o Fabio estávamos super tranqüilos e isso provavelmente passou a mensagem de que éramos relaxados ou despreocupados demais. O enxoval foi comprado no último minuto, a mala da maternidade foi arrumada no último segundo. Mas algo nos dizia que essas coisas como quartinho e malas eram o de menos. O principal era garantir o parto e a chegada da bebê da forma que queríamos. Além do mais, eu tinha certeza absoluta que a Julia iria vir com 41 semanas de gestação. Eu já havia até verificado o dia da virada da lua cheia. Pronto. Estava ‘decidido’ o dia que ela nasceria.
Mas, a partir da 39ª semana estava me sentindo estranha. Comecei a arrumar as coisas sei lá porque e a sentir o corpo diferente. Quando estava com 39 semanas e 2 dias, comecei o dia ainda um pouco mais estranha, mas nada que me chamasse a atenção. Logo de manhã, eu e o Fabio aproveitamos para ‘namorar’ um pouco. Sabíamos que é bom para o fim da gestação e, além disso, queríamos manter a intimidade do casal até o mais próximo possível do parto, já que a vida com o recém nascido em casa muda muito e essas coisas acabam ficando para segundo plano.
Continuei tendo um dia muito ativo. De manhã lavei roupa e limpei a casa. Fui no consultório médico depois do almoço. Foi lá que as contrações de BH, muito freqüentes nos últimos dias, passaram a ser um pouco doloridas na base da barriga. A Dra. Mariana disse que elas eram fracas e que a dor provavelmente era da bebê descendo um pouco. Depois da consulta fui buscar o carrinho e o bebê conforto na loja, fiz compras no supermercado, carreguei tudo até em casa, fui buscar o marido no trabalho. Tudo isso com as contrações, mas ainda sem dar muita bola para elas.
Por volta das 10h da noite, conversando com a Renata e a Mari no MSN (Mari é uma amiga apresentada para mim pela Renata, que foi doula no seu PD; hoje é uma amiga queridíssima que, assim como a Renata, me ajudou e ajuda MUITO com as questões de gestação, parto e bebê), comentei das contrações e comecei a monitorar a freqüência delas no relógio do computador. Elas vinham mais ou menos a cada 14 minutos. Conclui que os alarmes falsos começariam e que o parto em si provavelmente seria em alguns dias. Fui dormir.
Levantei mais ou menos a 1h30 da manhã, as contrações incomodavam. Como o Fabio estava trabalhando na sala, fiquei com ele monitorando o tempo e batendo papo. Agora elas vinham a cada 10 minutos. Não consegui voltar para a cama. Fiquei na sala mesmo, cochilando no sofá e monitorando o tempo. A freqüência diminuiu para a cada 5 minutos e a dor ficou um pouco mais chata. Eu caminhava pela casa, respirando e planejando o dia seguinte.
Quando deu 5h da manhã, senti uma contração bem forte, fui para o banheiro e lá um pouquinho de líquido com um pouco de sangue escorreu. ‘Deve ser a bolsa’, pensei. Acordei o marido e liguei para a Renata, que combinou de vir para a minha casa por volta das 7h00. Acontece que, depois desse episódio, as contrações passaram a doer bem mais e a ficar bem mais rápidas. Fabio começou a marcar o tempo comigo e vimos que o intervalo era de 2 minutos ou menos. Era hora de finalizar a mala da maternidade, carregar o carro e ligar para a médica.
A Renata chegou e já me achou entregue. Eu estava chorando e assustadíssima com a rapidez e a intensidade daquilo tudo. A dor havia aumentado demais de uma hora para outra e, sabendo a teoria do trabalho de parto, eu imaginava que iria ficar horas e horas naquilo e me desesperei. Mais importante que isso: eu não queria aceitar que, depois de ter tudo perfeitamente desenhado na minha cabeça, eu iria fraquejar tão cedo. Afinal, o trabalho de parto seria gradativo, eu iria trabalhando a dor na minha cabeça conforme ela viesse e aumentasse, e a parte dura mesmo seria no fim. Pois é, meu parto estava todo definido na minha cabeça. E eu estar morrendo de medo da dor tão no começo de tudo era um fracasso muito grande. Chorava de decepção.
A médica chegou por volta das 8h30 e me examinou. ‘O colo está fino como um papel’, ela disse, mas eu já me achava uma medrosa fracassada. Ela voltou para o consultório e viria me ver de novo na hora do almoço. Depois fui ficar sabendo que ela chamou o Fabio no canto e disse que a dilatação era de apenas 1 cm, que eles precisariam me acalmar e me fazer descansar, pois ainda iria demorar um pouco.
A Renata e o Fabio foram me ajudando a tentar aceitar a dor das contrações. Por um tempinho até consegui cochilar entre elas, mesmo com um intervalo tão curto. Mas volta e meia eu voltava a me desesperar e chorar. ‘Que dor era aquela? Não era para ser assim, tão rápido! Imagine se for doer assim, aumentando de intensidade, até a madrugada! Eu nunca iria conseguir!’. Nessa hora o apoio da Renata e do Fabio foram a coisa mais importante do mundo. As massagens e as palavras, mesmo eu não aceitando os argumentos deles.
Em um desses momentos mais ‘punk’, a Renata sugeriu o chuveiro. Provavelmente um pouco de água quente iria me acalmar e eu conseguiria levar mais algumas horinhas. Fiquei lá não sei quanto tempo. Com a Renata conversando comigo, enquanto eu chorava. E foi ali, no chuveiro, que a vontade de empurrar no fim de cada contração, começou a ficar mais intensa. Como a Dra. Mariana disse que eu poderia empurrar se tivesse vontade (afinal, a bebê nem havia encaixado ainda e provavelmente estava fazendo isso), eu fui obedecendo ao que o corpo pedia.
Todo aquele tempo debaixo do chuveiro quente e empurrando me deu um pouquinho de força. Resolvemos que eu iria sair e ir para a cama. Acontece que, saindo de baixo da ducha, veio outra contração bem forte e acabei sentando no vaso. A posição ali era boa e relativamente confortável, resolvi ficar. A Renata saiu do banheiro e me deixou sozinha com o Fabio, sentado no chão na minha frente. Ficamos lá um tempão, sozinhos, quase sem falar nada. Ele apenas me acompanhando, me apoiando, enquanto eu gritava e fazia força. Muita força.
A pressão embaixo começou a aumentar e a vontade de empurrar ficou incontrolável. Pedi para o Fabio chamar a Renata, que me explicou que a pressão era normal. ‘Mas, Re, está MUITO forte. Estou sentindo uma bola. Dá uma olhada para mim.’. Foi nesse momento que ouvi: ‘Olha, cabelinhos!’.
Pois é, a bebê estava coroando. Ia acontecer, daqui a pouco. Fui tomada por um pânico de não estar no hospital, de não ter uma médica ao lado, de estar numa fase do parto completamente diferente da que eu achava que estava e pedi ajuda para a Renata. Mas, ao mesmo tempo, fui tomada por uma força e confiança que vieram não sei de onde e comecei a empurrar mais ainda.
Ouvi a Renata pedir para o Fabio ligar para a médica. Ouvi o Fabio ligando e dizendo ‘Dra., então, está nascen... Nasceu!’. E nessa hora a Julia saiu. Inteirinha, de uma vez, em uma única contração. A Renata amparou e me ajudou a pegá-la. E eu fiquei com cara de tonta, olhando um para a nenê minúscula chorando no meu colo, pensando ‘Que diabos aconteceu aqui???’. Em 2 horas eu havia dilatado os 9 cm restantes e passado por todo o período expulsivo. Agora entendo a força, a rapidez e a intensidade das dores...
Sei que nesse tempo o Fabio conversou com a Dra. Mariana, a Renata também, eles me ajudaram a ir para o quarto e esperar que as médicas viessem cuidar de mim e da Julia Mas eu não lembro muito bem como foi essa parte. De repente as médicas estavam lá, eu e a Julia estávamos bem.
Foi a experiência mais surreal e maravilhosa que já tive. Acabou sendo em casa, o ambiente perfeito para um nascimento, com a presença de quem me entendia e me ajudou a passar por isso.
A Renata foi a doula perfeita. Me conhecia desde o início da gestação, sabia o que fazer e o que dizer (ou não dizer) e teve toda a paciência do mundo comigo. Além de passar toda a segurança que a gente precisava num momento como esse. E tenho certeza que ela vai lembrar para sempre de ter amparado a Julia.
O Fabio foi o marido mais perfeito que eu poderia ter. Me emociono toda vez que penso no nosso momento de quase silêncio no banheiro, com ele do meu lado me apoiando. E agora tem se mostrado um pai magnífico. Participativo, amoroso, corajoso.
Esse parto foi perfeito. Exatamente por ter sido completamente fora do que eu imaginava que seria. O perfeito na minha cabeça deu lugar ao perfeito real, vivido e sentido por nós. E a Julia já veio ao mundo ensinando uma lição valiosa para a mãe dela. Espero que o nascimento da minha filha me ajude a entender e superar esse comportamento controlador e me ajude a viver mais as coisas como elas são e não como eu acho que elas deveriam ser.
Para quem quiser ler a versão da Renata, é só acessar aqui.
História simplesmente incrível! Parabéns pela coragem de contrariar essa medicina obstetrícia tão ruim que temos no Brasil. O dia que eu resolver ser mamãe com certeza vou querer conversar muito contigo! Um beijo Tissi
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