segunda-feira, 15 de abril de 2013

A Vila, versão Éricka Khalil Pereira

Sempre que consigo (tempo, carro, dinheiro, saco...) eu participo de eventos e palestras sobre crianças, educação infantil, família, etc. Sempre tem coisa legal para aprender, papos deliciosos para bater, comidinhas gostosas para comer e, quando podemos levar a preta, atividades delícia para curtir. Então lá fui eu no sábado, numa palestra sobre como educar os filhos no mundo de hoje, com uma educadora phoda. Como em qualquer palestra, a gente concorda com algumas coisas, não concorda com outras, aprende um monte de mais outras, o que deixa o papo e a experiência ricos e prazerosos. Mas gente, aquele velho discurso que eu ouço sempre tem me incomodado cada vez mais. Não sei se é pelo tempo que eu o ouço, ou pelo momento que eu estou passando, ou pelas escolhas que tomei e pretendo tomar. Mas incomoda.

Explico-me:
A conversa SEMPRE chega no ponto: o filho é seu, é sua responsabilidade, não se deve terceirizar para escola ou avós ou babás ou televisão ou whatever. Até aí, ok. Concordo. Então vão surgindo exemplos: comer com seu filho, com calma, participando da refeição; preparar o alimento dele; passear com ele; brincar com ele; fazer as atividades da escola; dormir cedo e acordar cedo; participar do ritual do sono; e tudo aquilo lá que a gente já conhece. E, É LÓGICO, surge a pergunta: "Mas querido palestrante, como fazer isso nesse mundo que vivemos? A gente trabalha muito, tem pouco tempo, está sempre correndo." E a resposta é, basicamente: "Encontre tempo. Trabalhe menos. Papai cuide das necessidades da casa enquanto a mamãe fica em casa com as crias, porque a presença da mãe, na primeira infância, é mais importante."
E eu ouço isso TANTO TANTO TANTO que tô querendo mandar tomar no meio do cu. Porque eu PRECISO trabalhar. O Fabio PRECISA trabalhar. Eu não vivo nesse ritmo de merda simplesmente porque eu acho legal.
Mas se eu mando tomar no cu, vem outra resposta que eu sempre ouço: "É uma questão de escolha, néam? Se quiser estar presente na vida dos filhos, tem que abrir mão de alguns luxos e trabalhar de casa, ou deixar de trabalhar, mas ter uma vida com mais qualidade."
Ok, ok, ok, PÉRA LÁ. Luxos. LU-XOS??? Algum de vocês me viu pessoalmente nos últimos 2 anos? Viu meu cabelo ou minhas unhas? Ou minhas roupas? Ou viu a minha mansão? Ou meu carro último tipo? Minhas fotos das viagens para a Europa? Rapaputa!
Tenho luxos, sim. Tenho internet e TV a cabo em casa. Estamos cortando a TV a cabo, porque também trabalhamos em casa nas horas vagas (olha que legal) e precisamos da internet. Vai mudar 100 reais no meu orçamento doméstico. Olha só que solução perfeita, não sei como não pensei nisso antes!
Eu também passeio bastante. Isso é verdade. Vou no cinema ou teatro ou jogo de futebol quando consigo ingresso de graça. Vou em eventos infantis (origem do post, né?) que são com um custo mais ou menos acessível, quando eu não aguento mais ficar só ralando e acho justo eu ter algum jeito de melhorar a vida da gente com um programa gostoso e informações importantes. Também vou em churrascos na casa dos pais e dos sogros, bancados por eles, claro. Viajo para a casa da tia quando consigo carona no carro.
Tenho uma faxineira 1 vez por semana, porque é a única vez que minha casa vê uma vassoura. E tenho alguém para cozinhar e congelar nossas refeições, porque da meia-noite as 6h eu tento dormir, mesmo com os intervalos das mamadas.
Ahn, esqueci. Eu tenho plano de saúde. Um puta dum luxo querer não depender do SUS, né, minha gente?

Peço mil desculpas as minhas amigas, mas TODAS as que eu conheço que fizeram essa escolha tem um marido com um emprego bacana que segura as pontas, ou uma mãe/tia/sogra/amante que faz o mesmo papel. EU NÃO TENHO. Tanto a minha renda quanto a do Fabio são muito importantes em casa. A gente paga casa, comida, transporte, saúde, educação, TUDO, com nosso dinheiro. E ainda assim temos um pouco de ajuda dos nossos pais. E ainda assim estamos devendo uma caralhada pros bancos.

Fica foda reduzir o discurso a "Se não for cuidar do jeito certo, não tenha filhos". Eu entendo de onde ele vem e concordo que filhos precisam ser bem criados, que não ter tempo ou dinheiro não é desculpa. Até mesmo porque, dentro das minhas possibilidades, eu e o Fabio fazemos o melhor que a gente pode e um tantão a mais que isso. Mas declarar que "é só trabalhar menos" me tira do sério.

Não, não é só trabalhar menos. Porque o mundo não pode depender só daqueles que conseguiram trabalhar menos, pegar seus filhos e correr para as montanhas, criando uma sociedade alternativa. O mundo precisa que não seja necessário trabalhar tanto. Que a saúde decente seja um direito garantido de verdade. Que educação de qualidade também. E que se tenha mais tempo para conversar com o vizinho, conhecer as pessoas e cuidar das coisas com amor. TODO MUNDO.

Um comentário:

  1. Um ponto de vista meu, na minha história.
    Eu não fui criada assim: "Filha, escolha uma profissão que quando vc for mãe e esposa vc possa conciliar com a sua vida profissional". Desde o maternal a gente é ensinado a escolher uma profissão que traga sucesso, dinheiro, bla bla bla o mundo corporativo, até mesmo o "não dependa do seu marido"... ai no final, dá essas merdas, a vida muda, a gente cresce e aprende que talvez o conciliar seja mto mais importante que o sucesso, se frustra com o que escolheu e fica perdida! Não tenho a formula magica e acho que ninguém tem, tente se encontrar com a Ericka de agora (e sei que vc ja ta fazendo isso) e tenho ctz que isso te fará achar o equilíbrio, ou o caminho menos pior...

    ResponderExcluir